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"É necessário saber perder tempo para comprometer-se nas lutas dos povos periféricos e das classes oprimidas. É necessário saber perder tempo em ouvir a voz de tal povo: suas propostas, interpelações, instituições, poetas, acontecimentos... É necessário saber perder tempo, no curto tempo da vida, em descartar os temas secundários, os da moda, superficiais, desnecessários, os que nada têm a ver com a libertação dos oprimidos." - Enrique Dussel

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

NATAL: CHAMADO À MISSÃO - CONVITE À CORAGEM*


Natal é, sobretudo, "... tempo de compaixão e de coragem, misericórdia e vigor. Tempo de equilibrar a alegria com o heroísmo. Tempo de dedicação e renovação!

É um tempo de muita luz, que nos desafia a uma postura tanto diante da sua ausência quanto de seu excesso: ambos podem nos cegar. Está na hora de enxergarmos a verdadeira luz em meio a tudo que ofusca!

E é preciso coragem para atravessar o que nos cega: com a mão á fronte, protegendo-nos da luz, atravessemos a ganância, o medo e a insegurança que reluzem tão poderosamente em nossos dias e noites...

Neste Natal, tenhamos a coragem de nos fazer presença, em vez de multiplicar os presentes! Estejamos presentes junto às pessoas, sobretudo os famintos, carentes e excluídos! Tenhamos coragem de deixar Papai Noel de lado, vestindo-o com calções e chinelos e lacrando todas as chaminés, para abrirmos nossos corações e portas à chegada salvadora do Menino Jesus em cada criança!...

Tenhamos coragem de falar às nossas crianças que, em vez de brinquedos e bolas, peçam bençãos e graças, abrindo seus corações para destinar aos pobres todo supérfluo que entulha nossos armários e gavetas. A sobra de um é a necessidade de outro, e quem reparte bens partilha Deus...

Tenhamos coragem de nos despir dos pudores, e fazer em família ao menos um momento de oração, ler um texto sagrado, agradecer ao Pai de Amor o dom da vida, as alegrias do ano que finda e até dores que exacerbam a emoção, sem que se possa entender com a razão. Finita, a vida é um rio que sabe ter o mar como destino, mas que ignora quantas curvas, cachoeiras e pedras haverá de encontrar nesse seu percurso...

Tenhamos coragem de cobrir nossas mesas de Natal com afeto e compaixão... Dispostos a renascer com o Menino, com urgência, trataremos de sepultar iras e invejas, amarguras e ambições desmedidas, para que o nosso coração seja acolhedor como a manjedoura de Belém...

Tenhamos coragem de, mãos dadas com o Menino-Deus, deixar que as águas lavem o avesso de nossa pele e, em seguida, caminharmos silentes rumo ao novo ano... E com os olhos fixos na Divina Criança, deixar que seu verbo se faça carne em nosso coração de pedra, cuidando para que cresça despregada da cruz, exaltada pela vitória inelutável da Ressurreição...

Enfim, tenhamos coragem de viver um terno natal, ousando corrigir o equívoco do poeta: pois o amor não é eterno enquanto dura, antes dura porque é terno. Amém."

( Pe. Paulinho)

* Retirado da liturgia da cantata de natal das crianças da Catedral Metodista de Piracicaba, no contexto do culto matutino do dia 15/12/2013

sábado, 30 de novembro de 2013

"AMAR" É CAMINHO... "CUIDAR" É CAMINHAR

Por Almir Fabiano Nicolau de Moraes

"Amar" é caminho, "cuidar" é caminhar no amor, compassadamente, continuamente, respirando Esperança e inspirando Deus em fôlego que sustenta o pulsar de um coração pelo Outro... Empoeirando os pés cansados, limpando-os com as próprias lágrimas que caem de seus olhos obnubilados que distorcem a visão, e logo não se tem mais certeza do caminho, nem do caminhar, nem da esperança, nem de Deus e, consequentemente, do outro; perde-te em ti mesmo e, prostrado, a poeria erguida de outros pés apressados culminam na cegueira, ardor resultante do esforço próprio em enxergar o caminho faz-te acostumar com as trevas... logo a escuridão é teu conforto, e a luz da vida é teu incômodo!
Pobre caminhante, cego de si mesmo, do outro e de Deus, vítima atropelada por "amantes" do caminho que, no esforço de manterem-se no caminho, perderam-se no caminhar, no cuidar, cuja pressa resulta em poeira ofuscante de outros caminhantes cansados... Pobre caminhante, que é o "caminho" sem o "caminhar"? E que é o "caminhar" sem o "caminhante"? Caminhantes do Amor, saibam que o caminho que trilham é caminho de dor e lágrimas, e o sorriso não virá das pegadas deixadas em terra molhada pelas lágrimas, mas sim da quietude de quem não tem pressa, se demora no caminhar, compassadamente e continuamente, respirando e inspirando, mantendo o pulsar do coração pelo outro; no mo(vi)mento do amar, do amar que se demora, há lágrimas suficientes para limpar os olhos doridos e ofuscados de poeiras levantadas por peregrinos que nem sabem onde tal caminho os levará!

A CU(ltu)RA DO TEMPO

Por Almir Fabiano Nicolau de Moraes



Não é o tempo que cura as feridas. O "tempo" é inexistente, além de uma construção histórica que apreendemos por "temporalidade", é uma faculdade presente no entendimento humano. Além do que, não podemos substanciar o "tempo", ele é um signo, uma representação observável fenomenicamente apenas a partir do referencial que nós criamos, ou seja, ele é experenciavel e não abstraivel. O tempo é a inscrição sígnica de nossa condição concreta de mundialidade no próprio movimento dessa condição perceptível por nossa consciência de "ser-no-mundo".
O tempo não cura nada. Esquecer não cura... Nossas feridas são superadas não em um signo o qual atribuímos caráter de substância, muito menos em qualquer relação antropomórfica relacionada a eventos fenomênicos de nosso cotidiano, mas sim no próprio exercício efetivo e concreto de "pôr-se no mundo", e oriundo da consciência de si gerada pela percepção do movimento dialético dessa condição de "ser-no-mundo". A dor emocional é uma modalidade de percepção de si no mundo, portanto, uma modalidade de ser. É necessário substituir referências estruturais de nossa percepção do (e no) mundo, substituir paradigmas, superar realidades experenciaveis na própria condição abstraivel de "estar-no-mundo"... Em outras palavras, o tempo é uma construção sígnica de nossa consciência em relação ao movimento próprio do "ser-no-mundo"; É uma construção que não muda a realidade da dor; essa só poderá ser resolvida e superada no próprio exercício de "pôr-se no mundo", ou seja, construindo a própria forma de ser no mundo... e o amor é um modo de ser (no mundo) que assume a dor, não para anulá-la, mas para (res)significá-la no movimento de si em busca de curar a dor do outro.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

DEIXE-ME



Deixe-me...
Porque o céu não nos permitiu
Porque o amor vai machucar seu lindo coração
Irá torná-lo doente...

Temos poucas coisas em comum, certo?
E o caminho que você e eu podemos andar juntos
Parece ser muito curto.

Você não pode manter as palavras de amor mais.
Você pode abrir as asas azuis  e voar bem alto.
EU ESTAREI DE PÉ, ONDE POSSA CHEGAR A VER SEUS OLHOS...

Deixe-me... deixe-me... por favor, deixe-me!
Deixe-me... deixe-me... está tudo bem.

Deixe-me...
Porque as pessoas vão tentar nos parar.
Porque o amor está contra tudo que está ao nosso redor.

Temos poucas coisas em comum, certo?
E o caminho que você e eu podemos andar juntos
Parece ser muito curto.

Agora eu deveria deixá-la ir por amor, não deveria?
Voe para um lugar maior,
EU ESTAREI DE PÉ ONDE A RESPIRAÇÃO SE ATRASA...

Eu estarei de pé onde eu possa chegar a ver seus olhos
Deixe-me... deixe-me... por favor, deixe-me!
Você pode abrir as asas azuis e voar bem alto.
EU ESTAREI DE PÉ ONDE A RESPIRAÇÃO SE ATRASA...

Eu estarei de pé onde eu possa chegar a ver seus olhos
Deixe-me... deixe-me... está tudo bem!
Deixe-me... deixe-me... eu te amo!

(Loveholic)



quarta-feira, 2 de outubro de 2013

A ESTATURA DE UM GRANDE HOMEM

Pelo rev. Nilson da Silva Júnior

Almir, a propósito do seu aniversário, pensei sobre a 


"Estatura de um grande homem"



Um grande homem é, sempre, bem mais que um homem grande, pois já nasce feito, nasce pronto, afinal, ser grande é ter essência, e a essência de uma pessoa ninguém tira e ninguém põe, porque é parte intrínseca do que forma e tece cada célula que temos...



Um grande homem é generoso, mesmo que não haja motivo, reciprocidade ou reconhecimento. Sua alma o faz bem querer, somente pelo bem que tem dentro de si. Por isso, nem sempre ama quem merece, nem sempre merece o que colhe e, mesmo assim, ama, planta e rega com carinho tudo o que faz. Um grande homem, é ético, é honesto e fiel. Não se desvia do que crê, não se envergonha do que acredita, luta pela verdade. Um grande homem confessa mágoas, pede perdão, volta atrás, sabe esperar, respeita e honra quem ama. É claro e transparente, é puro e companheiro.



Um grande homem acredita em si mesmo. Persiste diante da impossibilidade, transcende diante das dificuldades e sonha quando não é possível realizar seus desejos. Ama, por isso é abnegado, honra, por isso é incapaz de desrespeitar, sabe o que quer, por isso não se corrompe, acredita, por isso aprende a esperar, é humilde, por isso sabe reconhecer e ouvir.



Um grande homem não se interessa nas pequenezes do prazer efêmero, pois se ocupa na transcendência do que é eterno, admirável e sensato e, por consequência, terá o prazer de um dia olhar pra trás e perceber que a vida não foi em vão, a lisura não foi em vão, que a dor, a angústia, a honestidade e a espera, o sofrimento, a humilhação tiveram seu valor, já que através disso, pode galgar o que é mais nobre e honroso na pobreza humana, a satisfação de ter sido grande em seu caráter, grande em seus sonhos, grande em sua história.



Assim, Almir, o meu desejo é que você, cada vez mais, trilhe este caminho árduo e galgue, cada vez mais, o posto de um grande homem diante de Deus e de todos e todas que te querem bem...



Um forte e "grande" abraço...



Rev. Nilson

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

REFLEXÕES COTIDIANAS SOBRE O MACHISMO DE CADA DIA

Por Daya Maya Martins Alvim*

Desde que nascemos, somos incitados a reproduzir pensamentos e frases machistas. A mulher e o homem tem seu papel pré definido na sociedade. A mulher não pode, de forma alguma, ultrapassar o limite do bom senso. Dar os primeiros passos na relação? Jamais. Ter liberdade sexual? Piorou. Se mostrar independente e livre? Até que pode, mas tem que saber que "o povo vai falar".

No meu grupo de amigos -creio que no grupo de qualquer outra pessoa- ouvimos, diversas vezes, mulheres insultando as outras por conta da sua liberdade sexual. Termos como "vadia" e "Biscate" são um dos exemplos mais usados para se referir a uma mulher que usa seu corpo como bem entende, seja no modo de vestir, no modo de falar ou até no modo de agir.

Se você é mulher e fala assim das outras, reflita um pouco. Chamar nossas semelhantes de vadias, é dar margem para que os homens nos chamem assim também.

Todos nós já fomos machistas um dia, e, muitas vezes somos sem ao menos perceber. Toda mulher tem o direito de ser quem é, sem ser julgada e condenada por isso.

 Querer liberdade é, acima de tudo, querer livre o próximo.


*Daya Maya é estudante universitária do Curso de Direito na Universidade Metodista de Piracicaba

domingo, 8 de setembro de 2013

PASTORAL DO DIA 08/09/2013 - BOLETIM "O MENSAGEIRO" - CATEDRAL METODISTA DE PIRACICABA

TESOUROS EM VASOS DE BARRO
“Temos, porém, esse tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós” (II Cor. 4:7)

            Em nossa realidade social é comum a valorização da eficiência, da produção, da rapidez, das relações mediadas (e imediatas), do “fast food”... Nesta dinâmica “empreendedorista” do tempo cotidiano, somos inevitavelmente levados a entender o conceito de excelência a partir de nossas habilidades, da polivalência das funções que podemos desenvolver – em outras palavras: nosso valor é medido pelo que temos a oferecer à sociedade, e não pelo que somos.

            O versículo extraído da segunda carta de Paulo aos Corintos nos desafia a entendermos a excelência (podemos substituir pela palavra “sucesso”) sob outra perspectiva: a do agir misericordioso de Deus em nós, e o mais importante, apesar de nós. Como templo e morada do Espírito Santo, apesar de sermos fracos e falhos em nossas ações e intenções, possuímos o tesouro inefável do poder de Deus que age em nós e posteriormente por nós, nos capacitando para toda boa obra.

            O termo “excelência” presente no versículo, no original grego é “huperbole”, que significa “lançar algo além”. Aqui, excelência não tem a ver com a fraqueza do vaso de barro, que somos nós, mas com a magnitude do tesouro em nós, que é o conhecimento de Deus na pessoa de Cristo pelo poder do Espírito Santo. É Deus quem nos lança além, nos impulsiona em direção à vida abundante, nos lança para além dos desafios da vida cotidiana, dos problemas que se nos apresentam no viver diário, nos lança para além de nossas limitações, de nós mesmos e consequentemente em direção ao outro, ao próximo... Romper em fé, como diz um antigo cântico, é a perspectiva cristã para o sucesso, não nessa lógica consumista e mercadológica do fim, mas como meio para a promoção da vida e da dignidade humana.

            Portanto irmãos, que sejamos desafiados a romper com nossas frustrações por não nos adequarmos, por vezes, a essa dinâmica que tenta nos valorar apenas pelo que temos, mas, cingidos pelo poder de Deus em nós, que vivamos a realidade do impulsionar divino em todos os momentos e áreas de nossa vida, e cuidarmos para não relegarmos a nossa dedicação a Deus aos fins de semana; vasos de barro sim, mas brilhando o resplendor do tesouro de Cristo em nós... Assim:

Em tudo somos atribulados, mas não angustiados; perplexos, mas não desanimados.
Perseguidos, mas não desamparados; abatidos, mas não destruídos;
Trazendo sempre por toda a parte a mortificação do Senhor Jesus no nosso corpo, para que a vida de Jesus se manifeste também nos nossos corpos” (II Cor. 4: 8-10).

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

INTRODUÇÃO À FILOSOFIA DA ARTE, de BENEDITO NUNES: UM ESTUDO DIRIGIDO

Por Almir Fabiano Nicolau de Moraes


O estudo dirigido sobre o livro de Benedito Nunes visa cumprir os requisitos de atividades didáticas extraclasse, para a disciplina de Estética, além de complementar os conteúdos trabalhados em sala de aula, com uma obra específica para a filosofia da Arte.
O livro utilizado para este trabalho é a edição de 1999 – 4ª Edição, portanto – da editora Ática. A obra está estruturada em quatro partes, a primeira com quatro capítulos trata sobre os conceitos preliminares sobre a filosofia da arte, a segunda, com cinco capítulos, trata sobre a relação entre a arte e a realidade, a terceira parte, também com cinco capítulos, versa sobre a relação entre a arte e a existência, sendo a última parte o epílogo da obra.
A obra de Benedito Nunes apresenta ao todo quatorze capítulos, além do epílogo, onde o autor realiza com proeza e maestria o desenvolvimento cronológico ao mesmo tempo que temático/conceitual da filosofia da Arte, apresentando ao final da obra uma sumária bibliografia sobre o tema, para quem desejar aprofundar-se nos estudos da filosofia da arte.

PRIMEIRA PARTE: CONCEITOS PRELIMINARES

            No primeiro capítulo Benedito Nunes salienta que os primeiros filósofos gregos preocuparam-se com os elementos constitutivos das coisas, bem como os Sofistas do século V a.C. preocuparam-se em debater temas de interesse prático (segundo ele movidos por uma época de crise ateniense), sendo que foi necessário esperar por Sócrates para debater a apreciação das artes. Platão, discípulo de Sócrates, suscitou três ordens de problemas acerca das artes: A essência das obras “pictórias” e “escultóricas” comparadas com a própria realidade, a relação entre elas e a Beleza, e os efeitos morais e psicológicos da Música e da Poesia, conseguindo então problematizar a existência e a finalidade das artes. Coloca também sobre Aristóteles a égide de ter escrito o primeiro tratado (teoria explícita) da Arte que a Antiguidade nos legou.

            Plotino teria  concebido à Arte uma importância metafísica e espiritual que não poderia ser aceita pelos pensadores cristãos, propensos a considera-la objeto mundano; porém, à medida em que “vai decrescendo o interesse intelectual pela arte” intensifica-se o interesse filosófico e teológico sobre a ideia de Beleza. A Beleza para os filósofos medievais pertence essencialmente a Deus, e sua relação com as artes é acidental, não essencial. A união teórica entre o Belo e a Arte se deu no Renascimento, originando na ideia de Natureza.

            No segundo capítulo, Benedito Nunes destaca que o que caracteriza o estudo da estética não é simplesmente o estudo do Belo, mas “vincular esse estudo a uma perspectiva já definida”, já vislumbrada pelos teóricos das artes do século XVII e XVIII, sendo que os dois sentidos, a vista e o ouvido, desempenham função primordial na produção deste deleite. Segue definindo a palavra Estética, do grego aisthesis – “o que é sensível ou o que se relaciona com a sensibilidade”. Desta forma, o Belo não é captado pelo conhecimento intelectual, mas relaciona-se imediatamente com determinada ordem de impressões, sentimentos e emoções, onde o deleite é satisfatório, bastando-se a si mesmo.

            Benedito Nunes cita o conceito de Belo de Baumgarten, que o define como “a perfeição do conhecimento sensível”, dividindo a estética em duas partes, uma teórica e outra prática. Cita depois a contribuição de Kant, responsável por estabelecer firmemente a autonomia do domínio do Belo, na Crítica do Juízo. Kant admite três modalidades de experiência: a cognoscitiva, a prática e a experiência estética, reduzindo o Belo à condição de objeto não determinado por conceitos e de característica desinteressada. Cita também a contribuição de Edmund Husserl com a fenomenologia, passando em seguida para a distinção entre Estética e Filosofia da Arte.

            No terceiro capítulo, Benedito Nunes destaca as três acepções gregas fundamentais do Belo: estética, moral e espiritual.  Na acepção estética, o Belo é a qualidade de certos elementos em estado de pureza, de toda espécie de relação harmoniosa; Na acepção moral, o Belo é a “mesótis” aristotélica, patrimônio das almas equilibradas, que mantém a harmonia, a igual distância da virtude e do vício; O Belo espiritual é o Belo intelectual, e entre estas três acepções há uma relação hierárquica. A união do conceito de Belo estético com o Belo moral efetivou-se no conceito grego de kalokagathia (ser belo e bom), conceito pedagógico da sociedade grega do século V A.C. Cita também os três princípios da filosofia  clássica: “o da imitação, para definir a natureza da Arte, o estético, para estabelecer as condições necessárias de sua existência, e o moral para julgar seu valor”.

            Nos tópicos seguintes, Benedito Nunes passa a esquematizar alguns conceitos da filosofia platônica, a fim de ampliar a abrangência do conceito do Belo em Platão. Discorre então sobre “a essência que não muda” (mundo inteligível), que abrange sua tese metafísica, a proveniência da alma no mundo inteligível (tese psicológica), e a beleza universal – portanto ideal – que é a essência do Belo. Confere superioridade à Poesia, por instigar a lembrança da beleza eterna, “reacendendo o desejo infinito do Belo, que se chama Amor”.
            Já no quarto capítulo, Benedito Nunes discorre sobre a estética na filosofia de Aristóteles, que segundo o autor diminui a distância entre o caráter contemplativo do Belo e a dimensão prática da obra de arte, presente na filosofia platônica. Para Aristóteles, a arte também possui causas naturais de matéria e forma, sendo que tanto o movimento natural como o prático saem da mesma fonte. A poética, como representação da realidade natural e humana, produz na narrativa trágica a Catarse, que é o meio termo entre a comiseração e o temor, identificando-se com o prazer intelectual e moral, produzindo um “misto de receio prudente e de simpatia”. Para Aristóteles, a beleza é a propriedade intrínseca na obra de arte, caracterizada pela ordem (inter-relacionamento das partes) e grandeza (extensão de cada uma e do conjunto), tendo assim a beleza “forma orgânica”.

            Em outros tópicos, Benedito Nunes discorre sobre a concepção de beleza suprassensível, imutável e eterna em Plotino, posteriormente o Belo como antecipação do gozo sobrenatural da vida eterna em Tomás de Aquino. Neste sentido, a herança aristotélica se dá na separação entre a arte operativa e a beleza contemplativa.

SEGUNDA PARTE: ARTE E REALIDADE

            Benedito Nunes discorre no capítulo cinco sobre o conceito de mimesis na filosofia socrática, aristotélica e posteriormente no Renascimento. Em Sócrates, a imitação se dá pela reminiscência, ou seja, o escultor e o pintor reconhecem as coisas que são belas associando-as num modelo ideal que já possuem na mente. Para Aristóteles, imitar é “representar, por certos meios – linhas, cores, volumes, movimentos e palavras – coisas e ações, com o máximo de semelhança ou de fidelidade”; assim, a mimese artística é o prolongamento de uma tendência natural aos homens e animais – a tendência para imitar. Em Platão existem dois atos miméticos fundamentais: a imitação primeira realizada pelo Demiurgo e a imitação moral que a alma faz do Bem e da Beleza. No Renascimento os artistas procuram imitar o que a natureza tem de essencial e perfeito.

            No sexto capítulo, Benedito Nunes realiza uma pequena explanação sobre a filosofia de Kant, passando por sua teoria do conhecimento e moral, para detalhar um pouco mais a crítica do juízo. Para Kant, os juízos estéticos não se fundamentam em conceitos, mas da experiência pessoal que estabelece juízos de gosto que tendem a universalizar-se, diferentemente da experiência empírica e da experiência moral. Assim, o Belo é “o que é reconhecido sem conceito como objeto de uma satisfação universal”, que por não estar subordinada a conceitos, possui valor autônomo, sendo um fim em si mesma. A experiência estética depende da imaginação para universalizar-se (jogos de imaginação).

            No capítulo sete, Benedito Nunes discorre sobre a filosofia estética de Schiller, que superando o dualismo entre sensibilidade e entendimento existente em Kant, acrescenta um terceiro impulso, o impulso lúdico – impulso para o jogo. Para Schiller, a Beleza é definida como “forma viva”, surgindo da convergência do subjetivo com o objetivo, e é com a Beleza que o impulso lúdico joga. Sem o jogo estético, o homem não seria espírito, ou seja, não teria adquirido liberdade em face da natureza; sendo assim, o jogo estético põe em jogo toda a realidade.

            Para Goethe, levando em consideração que o impulso lúdico é o impulso artístico, há dois impulsos artísticos, o de projeção e o de abstração.

            Benedito Nunes, no capítulo oito discorre desde o idealismo alemão até a filosofia das formas simbólicas de Ernst Cassirrer. Da filosofia de Scheling, salienta que a intuição do Absoluto se dá teleologicamente pela atividade artística, seguindo para um explanação da filosofia de Hegel, onde a Arte, juntamente com a Religião e a Filosofia, é um momento do espírito absoluto. Depois, parte para Schopenhauer e Nietzsche, ressaltando que a criação artística é um tipo de conhecimento primordial “vedado à Razão”. Em Bergson, Benedito Nunes ressalta que a arte é um meio condutor da emoção, sendo portanto um conhecimento intuitivo. Sobre Cassirer, cita que a arte, sendo uma das formas simbólicas, “é uma forma simbólica para o artista que cria e para a consciência que contempla o produto se sua criação”.

            No capítulo nove Benedito Nunes inicia discorrendo sobre o conceito de “expressão”, que para Leibniz é “o ato que consiste em relacionar certos dados atuais presentes a objetos ocultos ou distantes”; destaca também a acepção psicológica do termo: “expressão é o conjunto de efeitos exteriores da consciência, efeitos esses que são sintomas de processos interiores ou sinais de estados psíquicos, sentimentais e emotivos”. Utilizando da fenomenologia em Merleau-Ponty, cita que a intencionalidade não é simples ação voluntária, mas a direção da consciência para os objetos. Para Benedetto Croce, a Arte nasce da intuição de sentimentos que o artista converte em imagens, sendo que o que a distingue de outras manifestações do Espírito é a predominância marcante na poesia lírica, de sentimentos e emoções. Conclui o autor que “a forma artística não é alheia ao sentido nem exterior a ele: e constitutiva do sentimento e da intuição na poesia”, bem como os aspectos qualitativos e sensíveis integram as formas artísticas.

TERCEIRA PARTE – ARTE E EXISTÊNCIA

                Benedito Nunes, no capítulo 10, discorre sobre a relação entre a Moral e a Arte, bem como a ação moral da Arte, passando por Platão, Homero, Tolstói, Nietzsche, Bergson e Sartre, conclui em suma que “é revelando as possibilidades da consciência moral e não adotando uma moral, que a arte cumpre a sua finalidade ética”.

                No capítulo 11 o autor discorre sobre a relação entre a Arte e suas condições sociais, passando pelo naturalismo de Hippolyte Taine e o materialismo histórico de Marx. Para Hippolyte, assim como o meio físico determina a diversidade racial, estas determinam certos traços físicos e psíquicos que “se refletem nos sentimentos dos indivíduos e no caráter das instituições”, que por sua vez correspondem a inclinações que formam uma espécie de “meio moral” que influencia a atividade artística e seu conteúdo.  Já em Marx, a abordagem artística se dá por dois princípios gerais: Sendo pertencente à superestrutura da sociedade, é um fenômeno derivado da atividade social, e por sua natureza essencialmente prática, consiste em uma função ideológica. Estabelece-se então uma noção de “arte militante”, com uma estética que se legitima por um compromisso político prévio, instrumentalizada como recurso prático de uma luta revolucionária. Ao concluir o capítulo, Nunes estabelece uma relação dialética entre a Arte e a sociedade, no sentido de que “o artista não somente cristaliza na sua criação uma dada realidade social, mas responde ativamente às solicitações de seu meio, às exigências de sua classe, aos problemas morais, sociais e políticos de sua época”.

                No capítulo 12 é discutido o caráter histórico das Artes, onde o autor inicia com a concepção de “multivalência histórica” de Merleau-Ponty. Embora o objeto estético seja datável, situado num momento do tempo histórico,  o mesmo possui uma outra dimensão além da dimensão objetiva do tempo histórico (vertical e horizontal), que é a temporalidade “transversal”, por onde recorrem “os inesperados compromissos com o passado, a retomada de tradições que se olvidaram, a descoberta de veios inexplorados que passam a estimular a criação artística.” Ainda há uma quarta dimensão histórica da arte, subjacentes às outras três, onde assenta-se o que há de durável e permanente nas obras artísticas. Assim, após discorrer sobre a relação entre a Arte e a dimensão histórica pelo conceito de “Concepção-de-Mundo” em Hegel, conclui o capítulo considerando que as formas artísticas têm uma “natureza dúplice”: são temporais e intemporais.

                Benedito Nunes, no capítulo 13 discorre sobre os prognósticos acerca da Arte, iniciando pela morte da Arte anunciada por Hegel e Marx, tendo o primeiro por causa “o abandono pelo Espírito do ‘invólucro da Arte’”, e o segundo as novas relações de produção decorrentes do capitalismo industrial. Outro diagnóstico é dado por Lewis Mumford, segundo o qual o tecnicismo ameaça absorver a expressão artística. Segue discorrendo sobre os desdobramentos destes prognósticos, principalmente no Dadaísmo e Surrealismo.

                Por fim, Benedito Nunes discorre no capítulo 14 sobre a Arte abstrata, o desinteresse do Belo e a destruição da Estética: “O problematismo da arte contemporânea é, portanto, radical. Em cada obra de arte que se produz está em jogo o destino da arte; em cada uma delas o artista arrisca-se a mata-la ou a fazê-la existir”.


terça-feira, 16 de julho de 2013

PEDI A DEUS


Eu pedi a Deus força para poder realizar.
Fui feito fraco para poder aprender a obedecer.


Eu pedi a Deus saúde para poder fazer coisas maiores.
Recebi enfermidade para poder fazer coisas melhores.


Eu pedi riquezas para poder ser feliz.
Recebi pobreza para poder ser sábio.


Eu pedi poder para poder ter o louvor dos homens.
Recebi fraqueza para poder sentir a necessidade de Deus.


Eu pedi tudo para poder desfrutar a vida.
Recebi vida para poder desfrutar tudo.


Não obtive nada que pedi, mas tudo o que eu esperava. Quase apesar de mim mesmo, minhas orações não pronunciadas foram respondidas.


Dentre todos os homens, sou o mais ricamente abençoado.




(Carta anônima a Ann Landers)

quinta-feira, 11 de julho de 2013

PENSAMENTOS DE UM PÁSSARO

POR Saulo Hudson Nery Loiola

Enquanto caminhava nesta tarde de inverno, passei por um prédio observando o último apartamento no alto onde havia três gaiolas penduradas.

Me interessei por essa situação e refleti um pouco...como de costume.
De maneira alguma aqueles pássaros, por mais perto que estivessem do céu, experimentavam a sensação de estarem voando...Assim como nós humanos que nos alimentamos de ilusões e mentiras que nos amparam.
Nos acomodam.

Estar preso perto do céu e voar por ele (sentindo o vento sob as asas), não é a mesma coisa absolutamente.
Engraçado, que por vezes é uma condição que enclausura, mas ao mesmo tempo é fácil, cômoda. Seu único desafio como pássaro enjaulado é se entocar em um ou outro poleiro. Mais triste ainda quando somos pássaros engaiolados pela nossa mesma espécie, convencidos a ficar ali.
Sejamos mais inconformados, livres, desbocados.
Conheçamos cada dia nossas potencialidades (e fragilidades); Aprendamos, tropecemos e perdoemos.

E que para início de conversa, não troquemos a vista encantadora da sacada pela oportunidade de voarmos dela.
Afinal, o vento veio ao mundo dos pássaros para dar-lhes liberdade.


Araçatuba, São Paulo.
Inverno passado.

domingo, 23 de junho de 2013

A REALIDADE DO AMOR

Pr. Márcio Valadão

"Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna" (João 3:16)

Esta é a realidade maior do amor de Deus, Ele prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores; nós os seres humanos conhecemos o amor apenas através de condições: amamos "quando", amamos "se", amamos "porque", mas o amor de Deus, esse amor incondicional, Ele não nos ama por causa de nossos valores ou méritos, Ele escolheu nos amar... essa realidade do amor do Senhor, e só podemos conhecer toda a extensão desse amor, toda profundidade, toda largura, toda altura, somente quando olhamos para a cruz. Ao contemplarmos o Calvário, ao vermos ali a realidade do amor de Deus sendo encarnado, se dando, se oferecendo, para que pudéssemos ter a Vida Eterna...
Só a cruz, somente ela, e somente através do sangue que foi derramado ali, é que podemos experimentar toda a realidade do amor de Deus; Ele escolheu nos amar, Ele escolheu nos amar, Ele escolheu nos amar de tal maneira que deu o seu Filho, e isto é que é o verdadeiro, e eterno amor.



domingo, 21 de abril de 2013

SOBRE O SACRIFÍCIO


Os Antigos, quando queriam prognosticar o futuro, sacrificavam os animais, consultavam-lhes as entranhas, e conforme o que viam nelas, assim prognosticavam. Não consultavam a cabeça, que é o assento do entendimento, senão as entranhas, que é o lugar do amor; porque não prognostica melhor quem melhor entende, senão quem mais ama. E este costume era geral em toda a Europa antes da vinda de Cristo, e os Portugueses tinham uma grande singularidade nele entre os outros gentios. Os outros consultavam as entranhas dos animais, os Portugueses consultavam as entranhas dos homens. A superstição era falsa, mas a alegoria era muito verdadeira. Não há lume de profecias mais certo no mundo que consultar as entranhas dos homens. E de que homens? De todos? Não. Dos sacrificados. [...] Se quereis profetizar os futuros, consultai as entranhas dos homens sacrificados: consultem-se as entranhas dos que se sacrificaram e dos que se sacrificam; e o que elas disserem, isso se tenha por profecia. Porém, consultar de quem não se sacrificou, nem se sacrifica, nem se há-de sacrificar, é não querer profecias verdadeiras; é querer cegar o presente, e não acertar o futuro.

FONTE:
MOTA, C.G. Ideologia da Cultura Brasileria In: ALVES, R. Conversas com quem Gosta de Ensinar. Cortez editora, São Paulo: 1983, pg.81.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

QUEM É QUE TE REPRESENTA ENTÃO?

POR Matheus Giuliano Geraldi *


Estamos em um país onde tudo funciona muito bem por debaixo dos panos e a corrupção impera, e hoje impera com naturalidade, como se fosse algo normal, o que hoje de fato é.
É normal no Brasil que político tenha seus interesses a frente dos interesses do povo. O político mente descaradamente, e quando a mentira também se torna natural, como faz?


Não temos bons exemplos em nosso país. Na TV sabemos que o programa de maior audiência segundo a emissora premia um cidadão por não fazer nada de bom a ninguém, entretenimento não conta como algo bom nesse caso pois esse tipo de entretenimento um coala se alimentando lindamente também pode nos proporcionar. No futebol temos os absurdos da Copa, que a maioria de nós reclama mas não tem muito o que fazer a respeito, sabemos que está errado e por nos sentirmos incapazes nada fazemos. Ainda no futebol, um sujeito que não diz nada de espetacular, não tem o mínimo de bom gosto, é um menino sem atitude alguma e recebe mais de um milhão por mês pra fazer firulas e cantar com o Michel Teló (grande cantor de uma ridícula música só) no programa da virada da rede Globo. Aliás, Michel Teló, quem é esse cara pra receber tanto a nossa atenção? E as letras absurdas de "música" que temos com mensagens que agridem e desvalorizam a mulher? De onde sai essa gente pessoal?! Que tipo de cultura 'idiota' nos alimenta?! O pastor não pode falar contra os gays assim como o funkeiro não deveria falar das mulheres do nosso país como se fossem vagabundas poxa!



Silas Malafaia e Marcos Feliciano foram nomes muito comentados ultimamente. O Malafaia porque todos ainda insistem em pegar no pé do cara porque ele talvez seja homofóbico e o Feliciano quase pelo mesmo motivo. Porém, ambos só se tornaram alvos depois de aparecerem na mídia que manipula tudo conforme o seu interesse em nosso país e vai saber quais são os interesses da mídia... O Malafaia e o Feliciano são ignorantes antes de qualquer outra coisa, ou seja, não deveriam ser referência de coisa alguma! E, tem muita gente criticando denominação cristã por causa desses caras, o que é um erro pois tem muita igreja evangélica realizando ótimos projetos sociais.


Pessoal, “Bem-vindos a selva”, estão reclamando do que? O que é que tem acontecido de novo e de tão ruim no Brasil que já não tenha acontecido antes? 
Continuamos votando mal, continuamos ignorantes, porque me desculpem (ou não, tanto faz), mas compartilhar imagem pagando de rebelde no Facebook não muda porcaria nenhuma. É desencargo de consciência, gente motivada pelo mesmo tipo de influência que a mídia se utiliza, e enquanto você paga de rebelde a turma do mensalão está com cargos importantíssimos (mais importante que o cargo do Feliciano) e a galera ainda fica se fazendo de bem informada compartilhando essa onda no Facebook.

Enfim, você apenas compartilha foto o tempo todo, você apenas repassa informação, mas você pouco faz, você pouco fala! Escreva a sua opinião e pare de repassar informação que mal sabe de onde vem.


Diga e faça algo você mesmo, com as suas palavras, mostre a sua cara, diga o que você acha e assine! 



Enquanto você fica em silêncio eu te pergunto: Se nem você o faz, quem é que te representa nesse país?


* Matheus Giuliano Geraldi é Designer Gráfico na empresa Design Studio

segunda-feira, 1 de abril de 2013

FORMAS DE SER, PRÁTICAS SOCIAIS E ALTERIDADE

POR Almir Fabiano Nicolau de Moraes



Na atual conjuntura social, onde a proxemia física concretiza-se em detrimento da experiência da proximidade meta-física num contexto de globalização, o entendimento do Outro tem sido um exercício restringido à afirmação (instrumentalizada) do ‘Eu-Total’ pela prática de-compositora da Razão. O espaço geo-físico (guardado o devido pleonasmo) superado no contexto dos “Ciber-relacionamentos” são cabíveis exemplos da proposição supracitada, tendo em vista o contraste de relacionamentos sociais convencionais, onde o Outro é tratado como "um-diferente”, ao passo que no universo “Ciber-cultural” o Outro se apresenta como “um-mesmo”. Este “não-reconhecimento” do Outro como “um-diferente” é sintomático de um contexto de instrumentalização das relações sociais por um “Eu” que não reconhece o Outro, nem se reconhece no Outro, mas reconhece-se (afirma-se) pelo (e apesar) do Outro.
            Trata-se, de certa forma, de uma “diagnose” de atuais práticas sociais determinantes (ou resultantes) de formas de Ser. Neste caso, relações virtuais que atualizam-se em práticas sociais de instrumentalização do Outro referem-se a formas de ser pautadas pelo racionalismo perspectivista. Estas práticas sociais efetuam a de-composição do Comum em indivíduos totalizados, microcosmos perspectivados e alienados da “Comum-unidade”.
            Sinalizo a tese proposta pelo querido professor José Maria de Paiva, em nossas reuniões em sala de aula, de que tais “Formas de Ser” advenham de práticas sociais mercantis. Não me deterei nisto, embora saliente a coerência de tal argumento em relação à análise de conjuntura supracitada. As práticas mercantis, que emergiram a partir do distanciamento (consciente) do “É” em relação à physis, consistiam da perspectivação do meio (natura, bioma) e sua conseqüente valoração, tendo em vista relações comerciais baseadas na troca. Com a finalidade de resolver questões dúbias em relação ao estabelecimento do valor igualitário do objeto da troca, surge a moeda, o dinheiro (denário), símbolo e convenção da prática mercantil, resultante do entendimento racional, e resultando em um grau maior de subjetividade. Tais práticas sociais graduam-se na instituição do salário, que podemos sinalizar como a valoração agora não apenas do objeto da troca, mas do Outro, um “É” tido como escravo, funcionário, oficial ou jornaleiro. Eis que, em nossos dias, a prática mercantil elevou-se à instrumentalização do Si-próprio, o “É”, agora tomado como mercadoria; não bastou instrumentalizarmos o meio-ambiente e seus recursos, a técnica e a cultura humana, houve a necessidade de instrumentalização da própria subjetividade, do Si-mesmo, tomado como objeto de lucro – quem nunca ouviu falar em “empreendedorismo” e “marketing pessoal”?
            Aqui estou “Eu”, no afã da solidão (passiva) em detrimento da solitude (ativa), perto apesar de longe, esgarçado em minhas malhas do “Si-mesmo”, perdendo-me de mim no intento desesperador de achar-me... “Ecce homo” – o que fareis dele ???
              Não pretendo res-ponder à indagação acima, mas posso apontar um caminho possível – e não é de se estranhar que se estruture em uma prática social: o Amor.
              O “pathos”, ou o afeto, refere-se a um modo de ser que subsume o Diferente, que conhece o mundo por um entendimento afetivo que não perspectiva, mas assimila o Todo. Já dizia Pascal que “o coração tem suas razões, que a própria razão desconhece”. O afeto é a possibilidade do Si-mesmo assimilar o Outro, senti-lo em Si e sentir-se nele. E neste processo que constitui o É, não há distanciamento e nem instrumentalização, mas há “Expressão fluidora” de Vida. Não há retorno ao entendimento afetivo, uma vez feito uso do modo de ser racional. Neste sentido (restrito), são antitéticos. Uma vez submerso no entendimento perspectivista, o afeto constitui-se como anulação do “É”. Na impossibilidade, surge o milagre do Amor.
              Entendo o Amor não como um afeto, mas arrisco-me a tomá-lo como um “Modo de Ser” capaz de transcender a razão e o afeto, sem porém, anulá-los. Amor, assim, estaria no âmbito da práxis, sendo:
“partilhar a Existência, no exercício de oferecer a Vida em serviço...”
“Amor” é um modo ser, “Amar” é a prática social do Amor, ou seja, a solidariedade. Pouco me importam as concepções gregas do amor – para mim não passam de modalidades do Amor. O Amor aqui descrito circunscreve-se no ato de sacrifício do Si-mesmo, que ao partilhar da potência da Vida afirma-se pela assimilação do Outro como “um-mesmo-diferente”. É um paradoxo, não nego – mas se não o fosse, seria meramente racional...
              O Amor é o modo de ser que partilha a gratuidade da Vida com o próximo – reconhecendo-o como um “Eu”. Mas é um sacrifício, pois não parte da análise do que se tem para dar, mas sim do que o Outro necessita; sacrifício egoísta que concretiza-se no altruísmo. Eis aqui o Amar – a solidariedade, que retorna ao Comum pela escolha individual. Não que seja conveniente, vantajoso ou agradável – muito pelo contrário, mas é o pulsar que lança fora todo o medo (cf. I Jo 4:18), que faz a soma das partes superar o todo, que nos leva a experenciar a proximidade que independe do espaço geo-físico.
              O Amor também instrumentaliza, instrumentaliza a morte para a Vida, tornando cada “Eu” eterno no “Outro”. Faz da Vida – estância à gratuidade – o maior Bem a ter e consequentemente oferecer. Solidariedade é a partilha deste Bem.
              Sinalizei que apresentaria (apenas) um caminho possível, enfatizando a não pretensão de trazer respostas (no sentido de darem conta do Todo que constitui o problema); isto, porque não posso incorrer-me no erro de tentar conceituar, de-finir (delimitar) o Amor. Apenas apresento (já fruto de um modo de ser social racionalista) uma perspectiva do mesmo.
              O desafio que se apresenta não se constitui no reconhecimento do Outro – mas na realização da “Experiência da Proximidade”. Quem a fará, para além de nossa (ciber)compreensão do Si-mesmo, do Outro e do Mundo?
              “Agora, porém, permanecem estes três: A Fé, a Esperança e o Amor – mas o maior deles é o Amor” – I Cor. 13:13.




sábado, 30 de março de 2013

A PSICOLOGIA COMO CIENCIA INDEPENDENTE [IN: PSICOLOGIA UMA (NOVA) INTRODUÇÃO]

POR Almir Fabiano Nicolau de Moraes


No século XIX começam a se constituir ciências da sociedade, como a Economia, Política, História, Antropologia, Sociologia e Linguística, todas tratando das ações humanas, das suas obras e seus comportamentos, estando então as questões psicológicas dispersas nos diálogos entre essas ciências. Podemos analisar como se deu essa emergência da ciência psicológica fazendo um panorama sobre a história do pensamento, do Positivismo à contemporaneidade, e levantarmos as questões da subjetividade privatizada, sua experiência e experiência de sua crise.
            No positivismo de Auguste Comte (1798-1857), só havia lugar para as ciências biológicas e sociais, e como o ‘objeto de estudo’ considerado da Psicologia era a mente, e essa por sua vez não era passível de observação, não se achou lugar para a Psicologia se constituir ciência, tendo que entender-se ora parcialmente reconhecida como dependente da ciência biológica, ora da ciência sociológica. Como resultado de pesquisas historiográficas e antropológicas reconhecerem a experiência da subjetividade privatizada enquanto um fato social, portanto desenvolvendo-se, difundindo-se e propagando-se num contexto sociológico, surge o interesse de estudar-se os fatores constitutivos dessas experiências subjetivas enquanto tradições culturais.
            Estas mesmas pesquisas acabaram por demonstrar que as grandes irrupções da experiência subjetiva privatizada ocorrem em situações de crise social, quando os valores, normas e costumes são contestados, surgindo novas formas de vida. Isso se dá pelo fato do homem se ver obrigado a recorrer ao seu ‘foro íntimo’, uma vez que a vivência de uma experiência de desconstrução valorativa força-o a construir referencias internas, inferindo sobre sua identidade, sentimento, desejo e concepção de justiça. O homem imerso nessa experiência subjetiva sente-se como livre, e responsável por sua própria vida.
            Podemos entender que essa experiência de ‘perda de referencias’ teve seu ápice no advento da Modernidade, uma vez que o Renascimento desconstruiu a sensação de ordem superior que amparava ao mesmo tempo que constrangia o homem medieval. O surgimento da Imprensa proporcionou a experiência da leitura silenciosa, o que propiciou a experiência da criação de um diálogo interno, desenvolvendo um ponto de vista próprio no sujeito. Essa falta de referencias ‘medievais’ no período moderno culminou no ceticismo, que levanta a questão da impossibilidade do conhecimento seguro sobre o mundo, que, somada ao grande individualismo crescente resultou em duas epistemologias distintas: O Racionalismo e o Empirismo.
            Nas “raias do Humanismo”, encontramos a tentativa de resgatar os valores medievais na pessoa de Pico Della Miranda, que chegou à concepção de que a liberdade é um grande e exclusivo dom de Deus, sendo o homem recompensado ou punido de acordo com o uso dele. Assim, o sujeito deve sujeitar-se mais uma vez, desvalorizando seus desejos e projetos particulares.
            Com o Iluminismo ( século XVIII), vem a dúvida da capacidade humana de atingir a verdade absoluta e indubitável, defendida pelo Racionalismo Moderno Cartesiano por meio da liberdade total da razão, em antítese ao Empirismo Moderno de Francis Bacon. O Filósofo Hume  coloca o “eu” como efeito de sua experiência, não mais como senhor dela, o que podemos perceber claramente em sua máxima “Tábula Rasa”. Já para Kant, o homem pode absolutizar as coisas tal como se apresentam para ele fenomenicamente, não as coisas ‘em si’ .
            Diante de toda essa dialética epistemológica, surge com o Romantismo (fim do século XVIII) a idéia de um homem não mais essencialmente racional, mas passional e sensível, deslocando assim o “eu” para um lugar obscuro. É com Nietzsche e sua ‘ filosofia-à-marteladas’ que a noção de “sujeito” e do “eu” são definitivamente desconstruídos, sendo relegados á ordem da ficção, e considerada fantasiosa toda afirmação de que exista uma posição central no mundo, de que o homem esteja nessa posição,e até mesmo a afirmação de uma unidade.
            O sistema sócio-econômico com suas cargas de conflitos e transformações também aprofundou e universalizou aquelas experiências subjetivas. A situação de barganha -  onde o que vale é ‘tirar vantagem do outro para o proveito próprio’ – levou a experiência de que os interesses de cada um são mais importantes do que os interesses da sociedade, bem como o mercado de trabalho, que baseia-se no pressuposto da massificação da condição humana, enquanto simples mão-de-obra, alienando o homem trabalhador de reconhecer-se experiente de subjetividade. Desaparece a noção de liberdade e solidariedade; nesse contexto, ser livre significa ser desamparado.
            Em contrapartida, na busca de reduzir os ‘inconvenientes’ da liberdade, das diferenças singulares, etc, o Estado instala no indivíduo um verdadeiro sistema de docilização e domesticação, colocando em risco as idéias liberais de igualdade, liberdade e fraternidade. A descoberta da presença forte desse sistema de docilização do indivíduo chamado Disciplina põe em crise a subjetividade privatizada, enquanto os indivíduos percebem-se iludidos nos ideais de liberdade e diferença, e os interesses particulares levam a conflitos. A liberdade para cada um tratar de seus negócios desencadeou crises, lutas e guerras.
            O Estado, vendo a necessidade de combater os movimentos reivindicatórios e para por um pouco de ordem na vida social, faz-se desenvolver-se em sua estrutura administrativa, burocrática e militar. Em meio a essa crise, expressa-se o reconhecimento de que existe um sujeito individual, e a esperança de que é possível padronizá-lo segundo uma disciplina, normatizá-lo, e colocá-lo enfim ao serviço de uma ordem social demanda uma psicologia aplicada, principalmente nos âmbitos da educação e trabalho. Assim, o próprio regime Disciplinar, em si mesmo, exige a produção de um certo tipo de conhecimento psicológico.
            Dessa forma, estabelece-se assim, no final do século XVIII as condições para a elaboração de um projeto de psicologia como ciência independente, e para as tentativas de definição do papel do psicólogo como profissional nas áreas de saúde, educação e trabalho.
           

FONTE: FIGUEIREDO, L.C.M; SANTI, Pedro Luiz Ribeiro de: Psicologia Uma (nova) Introdução.EDUC, SP, 2008 – 3ª edição. Pp. 12-53.


O PENSAMENTO CARTESIANO: INFLUÊNCIAS E CONSEQUÊNCIAS NA MODERNIDADE


Por Almir Fabiano N. de Moraes


INTRODUÇÃO

Neste trabalho pretende-se traçar um caminho que vai das considerações sobre o período histórico da modernidade até uma breve análise do pensamento de René Descartes, culminando no Discurso do Método, precisamente nas quatro regras do Método.
Para tanto, procurou-se estabelecer um singelo trabalho de pesquisa, a fim de trazer “polifonia” nas concepções e conceitos aqui trabalhados, necessária a todo trabalho para fins acadêmicos.
Pretendemos assim, trabalhar as considerações sobre o período histórico da modernidade a partir dos escritos de Julián Marias e Danilo Marcondes. Para trabalharmos sobre o Discurso do Método, tomaremos por embasamento as obras de Franklin Leopoldo e Silva, Ethel Menezes Rocha e o prefácio da terceira edição do Discurso do Método pela editora Martins Fontes, baseada nos escritos de J. M. Fateaud.

PARTE I: AS ORIGENS DO PENSAMENTO MODERNO

“A etimologia de ‘Moderno’, parece ser o advérbio latino ‘modo’, que significa ‘agora mesmo’, ‘neste instante’, ‘no momento’, portanto designando o que nos é contemporâneo, e é este o sentido que ‘moderno’ capta, oponde-se ao que é anterior, e traçando, por assim dizer, uma linha, ou divisão entre os dois períodos”.
(MARCONDES, 2006, pg. 140)
O conceito de modernidade para nós está sempre relacionado ao “novo”, àquilo que rompe com a tradição. É um período que convencionalmente compreendemos como sendo entre séculos XVII e XIX da nossa era.
O termo “moderno” já era usado na filosofia medieval, no movimento da “lógica modernarum” que se opunha à tradição anterior já no século XIV, no cristianismo, nas questões sobre o objeto da fé que opções “antiqui e moderni”, e na querela dos literários franceses das últimas décadas do século XVII, os quais distinguiam “les ancians et les modernes”.
Portanto, a identidade do período moderno se estabelece inicialmente como uma ruptura e rejeição da autoridade da tradição seguidos de uma concepção de superioridade do “novo”.
Cabe aqui mais uma citação de Danilo Marcondes sobre a concepção de modernidade:
“[...] Duas noções fundamentais estão, entretanto, diretamente relacionadas ao moderno: a idéia de progresso, que faz com que o novo seja considerado melhor ou mais avançado do que o antigo; e a valorização do indivíduo, ou da subjetividade, como lugar de certeza e da verdade, e origem dos valores, em oposição à tradição, isto é, ao saber adquirido, às instituições, à autoridade externa”.
(Ibdem)
Marcondes estabelece três fatores históricos principais que podem ser atribuídos à origem da filosofia moderna: o humanismo renascentista do século XV, a reforma protestante do século XVI e a revolução científica do século XVII. Porém, salienta a importância de outros fatores históricos além destes:
“[...] Vamos analisar em maior detalhe como contribuem decisivamente para a formação do pensamento moderno, sem ignorarmos, no entanto, outros fatores históricos como a descoberta do Novo Mundo (1492), o desenvolvimento do mercantilismo como novo modelo econômico (...), e o surgimento e consolidação dos Estados Nacionais (Espanha e Portugal, Países Baixos, Inglaterra e França), que substituem o modelo político do feudalismo”. (Op. Cit., pg. 141)

I.A – O HUMANISMO RENASCENTISTA:

Marcondes salienta que foi Biagio Vasari quem primeiro empregou o termo “renascimento” (rinascitá) em sua obra “Vida dos mais excelentes pintores, escultores e arquitetos” (1550), para designar a retomada do estilo clássico na pintura pelo pintor Giotto, influenciando um novo estilo, que rompe com a arte gótica, característica do final do período medieval.
Salienta também que o conceito de Renascimento designando o período histórico intermediários, entre o medieval e o moderno origina-se do historiador da arte Jacob Burkhardt, em sua obra “A civilização do Renascimento na Itália” (1673).
Para Marcondes, o traço mais característico deste período é o humanismo, que segundo ele, chega a ter influência determinante no pensamento moderno. Discorre sobre as características deste período:
- Tem por lema o fragmento do filósofo grego da sofística Protágoras: “O homem é a medida de todas as coisas”. Para Marcondes, este lema marca a ruptura com o período medieval, visão hierárquica de mundo, arte voltada para o elemento sagrado e a filosofia à serviço da teologia;
- Retomada da herança greco-romana como base da nova identidade cultural;
- Temas pagãos centrais nas obras de arte;
- Rejeição da filosofia de Aristóteles (referencial escolástico), em contrapartida de uma preferência a Platão, porém um “Platão poeta, estilista da língua grega, dialético e de grandes dons literários;
- Rompimento com a visão teocêntrica e com a concepção filosófico-teológica medieval;
-Ruptura com a importância dada às ciências naturais;
- Tema da “dignitas hominis” (dignidade do homem) opondo-se ao tema medieval “miséria hominis” (miséria do homem);
- Valorização da liberdade humana, visão do homem como centro da criação, da dignidade natural e concepção do “homem como um microcosmo, que reproduz em si a harmonia do cosmo”. (conf. Op.cit.; pgs. 141 e 142).

I.B - A REFORMA PROTESTANTE:

Danilo Marcondes relata que a ruptura provocada pela reforma é um dos fatores da modernidade, no sentido de que o protestantismo – movimento de oposição à Roma – defende a idéia de que a fé é suficiente para que o indivíduo compreenda a mensagem divina dos textos sagrados (regra da fé), não necessitando de intermediação da Igreja. Para ele,
“a ‘regra da fé’ representa na verdade a defesa do individualismo contra a autoridade externa, o saber adquirido e contra as instituições tradicionais, todos colocados sob suspeita”. (Ibdem, pg. 147).
Em relação à influência da Reforma na filosofia moderna, vale citar mais um parágrafo de Marcondes:
“Podemos considerar assim que, de um ponto de vista filosófico, a Reforma aparece neste momento como representante da defesa da liberdade individual e da consciência como lugar da certeza, sendo o indivíduo capaz pela sua luz natural de chagar à verdade (em questões religiosas) e contestar a autoridade institucional e o saber tradicional, posições que se generalizarão além do campo religioso e serão fundamentais no desenvolvimento do pensamento moderno, encontrando-se expressas um século depois em seu mais importante representante, René Descartes. A ênfase dada por Lutero (...) à consciência, certamente prenuncia a filosofia de Descartes, bem como o espírito crítico característico da Modernidade".
(Op. Cit., pg 146).
Julián Marías cita a “regra da fé” como o aspecto mais importante da Reforma, porém ele usa o termo “o livre exame” para referir-se ao mesmo. Marías chega a determinar este aspecto da Reforma como “racionalismo puro”, estabelecendo consonância com a frase inicial de Descartes no Discurso do Método: “o bom senso é o que há de mais bem distribuído no mundo”. (Julián MARÍAS, 2009, pg. 298).
Julián Marías distingue dois tipos de Igreja Reformada:
- Igreja “Nacional”, que se forma em torno da pessoa do Rei;
- Confissão de Ausburgo, supõe um “acordo” sobre matérias de fé, um “protestantismo liberal” que se constitui na supressão de quase todo o conteúdo dogmático.
Pertinentemente, coloca como “o problema da Reforma” a divisão da Europa em Reforma (protestantes) e Contra-Reforma (católicos) – que alguns têm substituído pelo termo “Reforma Católica”. Sobretudo, porém, o que mais nos interessa destacar aqui são as conseqüências históricas que Marías elenca, dos sistemas racionalistas na física e na filosofia (Galileu, Newton, Descartes, Spiñoza e Leibniz):
- O ABSOLUTISMO:
“[...] Temos, pois, um Estado com uma personalidade, e este Estado tem suas razões: age, portanto, como uma mente. Trata-se de uma personificação racionalista do Estado, que aparece junto com as nacionalidades modernas”.
(Ibdem, Pg. 298).
Segundo Marías, a justificação racional da monarquia absoluta é a fala de Descartes sobre política, onde dita que as coisas são mais bem feitas quando feitas segundo a razão, e por um só, não por vários (Ibdem).
- A DIPLOMACIA:
Esta, para Julián Marías é apenas a substituição da relação direta de Estados entre si por uma relação pessoal abstrata.
Conclui assim:
“A nação está personificada no rei absoluto: as relações entre as nações se resumem e personificam na conversação de alguns poucos homens. Os Estados começam a ocupar um lugar na mente de cada indivíduo”
(Op. Cit., pg. 299).

I.C – A REVOLUÇÃO CIENTÍFICA:

Para Danilo Marcondes, a revolução científica moderna tem seu ponto de partida na “Revolução Copernicana” (1543), com a concepção heliocêntrica do cosmo. Representa para ele um dos fatores de ruptura mais marcantes no início da modernidade, uma vez que ia contra uma teoria estabelecida há mais de vinte séculos.
A rejeição dos modernos pelo Aristotelismo se explica pelo modelo geocêntrico do cosmo e pelo uso escolástico da lógica Aristotélica na demonstração de verdades universais e necessárias, em detrimento da observação e da experiência. A cosmologia não poderia ser considerada independentemente de seus pressupostos metafísicos e teológicos, um modelo que não “salvava os fenômenos” (MARCONDES, 2006, pg. 150).
Marcondes, sobre este aspecto, cita a transformação científica:
“Uma das principais transformações do ponto de vista da metodologia científica está precisamente na invasão dessa ordem de prioridades. A ciência moderna surge quando se torna mais importante salvar os fenômenos e quando a observação, a experimentação e a verificação de hipóteses tornam-se critérios decisivos, suplantando o argumento metafísico”.
(Ibdem, pg. 150).
Ainda seguindo a orientação de Marcondes, considera-se duas grandes transformações que levarão à revolução científica:
1) DO PONTO DE VISTA DA COSMOLOGIA:
- A demonstração da validade do modelo heliocêntrico, empreendida por Galileu;
- A formulação da noção de um universo infinito, que se inicia com Nicolau de Cusa e Giordano Bruno;
- A concepção do movimento dos corpos celestes;
2) DO PONTO DE VISTA DA IDEIA DE CIÊNCIA:
- A valorização da observação e do método experimental como ciência ativa, que se opõe à ciência contemplativa dos antigos;
- A utilização da matemática como linguagem da física, proposta por Galileu sob inspiração platônica e pitagórica, contrária à concepção aristotélica;
- A ciência ativa rompe com a separação antiga entre ciência (epistême), o saber teórico, e a técnica (techné).
“A Revolução Científica moderna resulta portanto da conjugação desses fatores, para o que contribuíram diferentes pensadores ao longo dos séculos XV e XVII, sendo que, em certos aspectos, rompe de fato decisivamente com a ciência antiga, mas em outros inspira-se ainda em teorias clássicas. Só com Newton, praticamente já no século XVIII, é que teremos a formulação de uma ciência físico-matemática plenamente elaborada em um sistema teórico”.
(op.Cit. pg. 151).
Trataremos mais sobre a revolução científica no próximo item.

PARTE II: O PENSAMENTO CARTESIANO

II.A – INFLUÊNCIA DA REVOLUÇÃO CIENTÍFICA NO PENSAMENTO CARTESIANO:

Ethel Menezes Rocha considerou o século XVII caracterizado por uma série de descobertas científicas que desafiam as concepções que perduravam por aproximadamente 2 mil anos. Já tratamos (superficialmente) da revolução científica na modernidade.
O que acrescentamos aqui é a relação de novas concepções científicas que influenciavam o pensamento de Descartes, os quais Franklin Leopold e Silva sinaliza:
- A concepção de um universo infinito e descentralizado de Giordano Bruno, em 1.584;
- A publicação da obra “Do magnetismo”, do inglês Gilbert, no mesmo ano em que Giordano Bruno foi queimado;
- A lei do movimento elíptico dos planetas em torno do Sol, de Kepler, em 1.605;
- A comprovação da teoria de Copérnico pela luneta de Galileu, que evidencia um universo não perfeito, como prova as manchas solares e as montanhas da Lua.
Além dos progressos em física, considera também:
- Os trabalhos matemáticos de Napia e Clavius;
- A obra de Willian Harvey sobre a circulação do sangue, em 1.628.
Por serem os principais responsáveis pelo abandono do sistema aristotélico, estes avanços científicos ocasionaram uma separação entre o saber filosófico e o saber científico.
Assim,
“A tarefa de Descartes será a de refazer o caráter sistemático do saber, unindo novamente ciência e filosofia, física e meta-física. E para pensar essa nova fundamentação ele conta com uma concepção de Galileu que está implícita na nova física, e que é formulada pelo astrônomo em sua obra O ensaiador: a natureza está escrita em linguagem matemática”.
(SILVA, F. L., 2.003, pg. 22,23)
Partindo da concepção galilaica, Descartes tentará encontrar os novos fundamentos para o conhecimento não apenas da natureza, mas também de Deus e da alma. Concepção esta cujo aspecto principal consiste em extensão do modelo de conhecimento matemático a todos os objetos.

II.B. SOBRE RENÉ DESCARTES: (Baseado nos escritos de Ethel Menezes Rocha)

René Descartes nasceu a 31 de março de 1.596 em La Haye, uma pequena cidade no distrito francês de Touraine, chamada La Haye – Descartes a partir de 1.802, e veio a falecer em Estocolmo, na Suécia, a 11 de fevereiro de 1.650. Seu pai era conselheiro no Parlamento e proprietário de terras, e sua mãe morreu 19 meses após seu nascimento, tendo sido, a partir de então, criado por sua avó materna. Aos 10 anos, foi enviado ao colégio Jesuíta de La Flèche, perto de Le Mans.
Em 1.611, iniciou seu primeiro ano de estudos em Filosofia, cujo núcleo de ensino era, sobretudo, a filosofia escolástica aristotélica.
Ao deixar La Flèche, Descartes viaja pela Europa e serve como voluntário nos exércitos holandês e bávaro, para “conhecer a verdade, a partir do contato com o mundo”. Em novembro de 1.616 Descartes se muda para a Holanda, onde encontra e inicia uma intensa colaboração com Isaac Beeckman, matemático e físico.
Durante o ano de 1.619, Descartes formula o que seria sua máxima ambição de vida: produzir uma ciência da natureza de acordo com os princípios matemáticos e mecanicistas. Em viajem pela Alemanha, começa a formular sua teoria geral do método e, na noite de 10 de novembro, uma série de sonhos lhe pareceu indicar a aprovação divina a esse seu projeto.
No período entre 1.620 e 1.626, Descartes tem encontros regulares com Mersenne, que advogava o mecanicismo como fundamento da nova física, e com o matemático Johannes Faulhaber que, diferentemente de Beerkman, concebia seu próprio projeto como mais amplo do que apenas uma ciência da mecânica, visão que Descartes compartilhava. Em 1.626, se muda para a Holanda, onde vive, com algumas breves interrupções, até 1.649. Durante esse período, em 1.643, o Cônsul de Utrecht condena a filosofia de Descartes, ameaçando a queima pública de seus livros. Em 1.647, Descartes é condenado por Revius e outros teólogos na Universidade de Leiden.
No final de fevereiro de 1.649, mudou-se para Estocolmo convidado pela Rainha Cristina, morrendo um ano depois.
PRINCIPAIS OBRAS E ESCRITOS:
- Regras para a direção do espírito (1.626 – 1.629)
- O mundo e Tratado sobre o homem (1.638)
- Discurso sobre o método (1.632)
- Ótica, Geometria e Meteorologia (1.637)
- Meditações Metafísicas (1.641)
- Objeções e Respostas (1.641)
- Em busca da verdade (provavelmente 1.642)
- Princípios da Filosofia (1.649)
- Notas contra um certo programa (1.647)
- As paixões da Alma (1.649)
- Conversações com Burman (1.648)

II.C – O DISCURSO DO MÉTODO:

O Discurso do método, embora fosse a primeira obra publicada por Descartes, não foi a primeira a ser escrita. Em 1.628 começou a escrever a “Regra para a direção do espírito”, e em novembro de 1.633 pensou em publicar “O mundo ou Tratado da luz”. Assustado pela ocasião da condenação de Galileu, Descartes decide renunciar à publicação de seu livro.
Em 1.637, Descartes publica o Discurso do método. Dentre as inúmeras razões aparentes que poderiam ter levado Descartes a tomar a decisão de publicar o Discurso, J. M. Fateaud elege três principais sendo a terceira a mais importante:
1ª – Por Questões de Reputação. Descartes quer aceitar os desaqfios que a obra lhe apresenta e, neste sentido, escreve o Discurso para mostrar do que é capaz;
2ª – Para despertar algum interesse por seus trabalhos;
3ª - Para “sondar o terreno”, ou seja, preparar o caminho para a publicação do “tratado de luz” ( FATEAUD Apud: Discurso do Método, Martins Fontes, 2.001, pg XX).
Convém citar:
“[...] Como se vê, uma tática perfeitamente clara: o Discurso deve despertar em alguns a vontade de conhecer o mundo, a ponto de intervirem junto ao Santo Ofício para permitir a Descartes publicá-lo sem perigo” (Ibdem, pg. XXI).
Fateaud observa que ainda que esta manobra audaciosa de Descartes tenha fracassado, não podemos perdê-la de vista quando lemos o Discurso, pois ela esclarece muitos de seus aspectos.
Embora o título do livro apresente uma aparente promessa de “explanação sobre o método”, o Discurso contém vários elementos inesperados, dentre os quais uma narrativa sucinta da carreira do autor, e um esboço bastante amplo de sua doutrina.
Fateaud aposta na possibilidade de esclarecer a intenção de Descartes ao escrever o Discurso do Método para entender a forma como foi organizado. Para tanto, traz duas citações de Descartes, nos quais acredita serem reveladores a este respeito:
“[...] meu propósito não é ensinar aqui o método que cada um deve seguir para bem conduzir sua razão, mas somente mostrar de que modo procurei conduzir a minha”.
(Discurso do Método, pg.7).
“[...] não ponho Tratado do método, e sim Discurso do método, o que é o mesmo que Prefácio ou Advertência sobre o método, para mostrar que não tenho intenção de ensiná-lo, mas somente de falar sobre ele. Pois, como se pode ver pelo que exponho sobre ele, consiste mais em prática que em teoria, e chamo os ensaios que vêm depois de Ensaios deste método, porque pretendo que as coisas que contêm não poderiam ser encontradas sem ele, e que através delas podemos reconhecer o que ele vale; assim como inseri alguma coisa de metafísica, de física e de medicina no primeiro discurso, para mostrar que o método estende-se a todos os tipos de matérias”.
(Carta a Mersenne de março de 1637 Apud: Prefácio do Discurso do Método, Martins Fontes, 2001, pg. XXV – grifo nosso).
Baseando-se nestas duas citações, Fateaud faz considerações sobre o Discurso do Método, as quais pretende-se neste trabalho apenas citar, conforme segue-se:
- Na primeira citação, sobressai claramente que a intenção do Discurso não é didática, e sim narrativa;
- A segunda citação especifica que não se deve esperar do Discurso um tratado, ou seja, que o objetivo de Descartes não é expor seu método, mas chamar sobre ele a atenção de quem lerá os Ensaios (Dióptrica, Meteoros e Geometria) que o seguem;
- A intenção dominante da obra é, no sentido estrito do termo, apologética;
- a finalidade do Discurso não é, realmente, analisar os principais aspectos do método, mas sugerir seus métodos.
O Discurso do Método – “Para bem conduzir a Razão e procurar a verdade nas ciências”, está dividido em seis partes:
1 – Considerações sobre a Ciência;
2 – Principais Regras do Método;
3 – Regras sobre a Moral;
4 – Fundamentos da Metafísica;
5 – Física, Medicina e a Alma Humana;
6 – Coisas necessárias para se ir além nas investigações.
Assim, a organização do Discurso do Método sugere a seguinte distinção:
1 – Ciências;
2 – Regras Gerais;
3 – Regras Morais;
4 – Metafísica;
5 – Física-Alma humana;
6 – Natureza-Razão.
Por ocasião da singeleza deste trabalho e outras limitações, nos atentaremos apenas à segunda parte do Discurso do Método.
II.D – O MÉTODO CARTESIANO:

Na segunda parte do Discurso do Método, Descartes começa a explanar o seu método, iniciando por estabelecer que o bom-senso (capacidade de distinção entre o falso e o verdadeiro), citado na primeira parte, só é possível de ser aplicado quando as coisas são feitas por uma só mente, e não por várias.
Propõe, em seguida, partir de uma “dúvida metódica”, com o objetivo de reformar os próprios pensamentos e construir um “terreno todo seu”.
Considera a lógica e ciências de origem escolástica como “confusas”, meramente “abstratas”, aparentemente “inúteis” e “restritas à considerações de figuras que fatigam muito a imaginação”. (Discurso do Método, pg. 27). Sendo assim, resolve propor para si mesmo quatro regras “firmes” e “constantes”, que substituirão o grande número de preceitos que a lógica é composta, para guiar sua busca da verdade:
A primeira regra era de “nunca aceitar coisa alguma como verdadeira sem que a conhecesse evidentemente como tal”;
A segunda regra consistia em “dividir cada uma das dificuldades que examinasse em tantas parcelas quantas fossem possível e necessário para melhor resolvê-las”;
A terceira regre pretendia “conduzir por ordem meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir pouco a pouco, como degraus, até o conhecimento dos mais compostos”.
E a última regra consistia em “fazer enumerações tão completas, e revisões tão gerais, que estivesse certeza de nada omitir”. (Ibdem, pg. 23).
Desta forma, podemos enumerar o Método de Descartes da seguinte forma:
1ª Regra: Clareza e Distinção.
2ª Regra: Análise.
3ª Regra: Ordem.
4ª Regra: Enumeração.
Franklin Leolpoldo e Silva considera, em relação ao Método cartesiano que:
- A primeira regra supõe duas atitudes daquele que busca a verdade: De um lado, deve evitar a prevenção, e de outro, evitar igualmente a precipitação;
- a segunda regra pressupõe a anterioridade dos elementos simples sobre as composições;
- A terceira regra é a que permitirá a dedução como forma de ampliar o saber;
- Finalmente, o preceito da enumeração pode ser visto, em parte, como síntese, já que percorre em sentido inverso o caminho percorrido pela análise, numa recuperação da visão de totalidade do conjunto.
(SILVA, 1.993. pg. 31)
Para concluir esta parte, citamos uma consideração de Ethel Menezes Rocha:
“Ao pretender explicar as condições de conhecer o ser, o método cartesiano desloca o enfoque de uma teoria o objeto para uma teoria da constituição do saber. Entretanto, além dessa preocupação que é compartilhada com os pensadores do séculoXVII, Descartes pretende ainda ter elaborado um sistema filosófico abrangente, que envolve uma física, uma lógica e uma meta-física, de moda a substituir a doutrina aristotélica”.
(ROCHA, E.M. apud: PECORARO, R. Clássicos da Filosofia, 2008, pg. 215).

PARTE III: CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao discorrermos sobre os fatores que propiciaram o surgimento do período Moderno, pudemos ver como a filosofia cartesiana é fruto de seu tempo. A necessidade de romper com a tradição escolástica/aristotélica, para instaurar um “novo”, para acolher a emergência de concepções que propõe não uma superação, mas uma negação dos valores da tradição, marca a ciência de seu tempo.
René Descartes torna o “ceticismo instrumental” como ponto de partida de sua filosofia, para ir ao encontro da “Mathesis Universalis”. Esta influência da redescoberta do ceticismo antigo, característico de sua época, levou Descartes a se defrontar com a impossibilidade da “dúvida da dúvida” – “Cogito, ergo sun”, anuncia seu retorno da jornada cética.
O ceticismo em Descartes não é um fim em si mesmo. Muito pelo contrário, é o ponto de partida para o conhecimento da verdade. Sua filosofia do Cogito está imbuída do espírito de sua época. Como Descartes fundamenta sua existência? Ora, se penso, logo existo. Como pôde chegar à esta conclusão? Utilizando seu método “para bem conduzir a razão e procurar a verdade nas ciências”.
Descartes parte em busca do conhecimento da verdade sem se preocupar com a questão da possibilidade de a razão humana acessar esta verdade. Ao propor o Método, Cartesius “baila na sinfonia do zeitgeist”. A crítica à possibilidade e limite do conhecimento da razão é o “topos” da filosofia de Immanuel Kant, no século XVIII.
Contudo, René Descartes não foi simplesmente resultado da influência de seu período, foi também influenciador.
Se o humanismo Renascentista fazia parte do espírito de seu tempo, foi em Descartes que se obteve seu ápice. Juntamente com os físicos e cientistas de sua época, Descartes foi o emancipador da razão humana. Nele encontramos os fundamentos do método científico, presente até hoje nas cátedras acadêmicas.
O nascimento da Ciência Moderna se deu na confluência de duas correntes epistemológicas: O Racionalismo e o Empirismo. Nas bailas da dedução, da análise e da síntese, ambas correntes epistemológicas se assentam no mesmo solo epistêmico da representação antopocêntrica.
Ao trazer o homem para o centro, rompendo com a tradição teocêntrica medieval, o cientista moderno se defronta com o desafio de explicar o funcionamento tão complexo de um cosmos que agora se descobre infinito, descentralizado e não-perfeito (Universo). Influenciados pela invenção do relógio, surge a concepção mecanicista do mundo.
Podemos considerar Descartes o ápice do pensamento moderno. Em sua filosofia, podemos enxergar exatamente os pressupostos da cosmovisão de seu tempo (ruptura com a tradição escolástica, valorização do indivíduo, o homem como centro e a visão mecanicista do mundo), porém, muito mais que síntese do espírito de seu tempo, René Descartes foi o emancipador da razão humana, um divisor de águas, instaurador da “razão instrumental”, tão cara à Ciência Moderna.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:

DESCARTES, René. Discurso do Método. Martins Fontes, São Paulo: 2.002, 3ª Ed.
MARCONDES, Danilo. Iniciação à História da Filosofia Moderna: dos pré-socráticos a Wittgenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zohar Ed. 2.006.
MARÍAS, Julián. História da Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2.004, pg. 297-309.
PECORARO, Rossano (org). Os Filósofos - Clássicos da Filosofia: vol.1. Ed. Puc-Rio, Rio de Janeiro: 2008.
SILVA, F.L. Descartes: a metafísica da modernidade. Ed. Moderna, São Paulo: 1993.