POR:
ALMIR FABIANO NICOLAU DE MORAES
ANDERSON ZEM
DONIZETI EXPEDITO SCHIAVINATO
JULIO CESAR FRESCHI
Introdução – A Emergência do
Movimento
“O
importante não é aquilo que fazem de nós,
mas o que nós mesmos fazemos do
que os outros fizeram de nós”
SARTRE
O século XX desmentiu as promessas,
abalou as convicções e mostrou o vazio de todos os sistemas filosóficos do
século XIX. A confiança no poder da razão, o entusiasmo com progresso
tecnológico, as vantagens da expansão industrial, a valorização da pátria e os
sentimentos nacionais, os acenos esperançosos do socialismo, enfim tudo o que
foi projetado no século XIX se converteu em grandes incertezas e preocupações
no controvertido século XX. As duas grandes guerras fizeram com que as luzes
acesas pelo Iluminismo se tornassem trevas. A Revolução Russa alavancou a
ascensão do socialismo em várias partes do mundo e, quase no fim do século,
assistimos ao colapso da União Soviética.
A mesma tecnologia que trouxe
avanços antes restritos a ficção, trouxe também a corrida armamentista, o medo
da destruição atômica, a degradação ambiental e fez com que as desigualdades
sociais se tornassem mais gritantes.
Do idealismo ao voluntarismo, do
positivismo ao espiritualismo e todos os valores por eles exaltados foram colocados
em xeque pelas ambigüidades do século XX, fazendo sentir a urgência de uma
renovação substancial da filosofia.
Intérprete desta renovação urgente
e, ao mesmo tempo, testemunha da situação de angústia na qual os horrores da
guerra lançaram a humanidade foi o existencialismo. O existencialismo surge e
se desenvolve nesse ambiente traumático, não se confinando a discussões
acadêmicas, mas tomando as ruas e se constituindo em um estilo de vida que
protestava contra os valores morais da sociedade vigente.
Parte I – As Definições sobre o
Movimento
“Um amor, uma carreira, uma revolução:
outras tantas coisas que se começam
sem saber como acabarão”
SARTRE
A palavra existencialismo pertence
aquela categoria de palavras, que ganhando em extensão, perde em compreensão.
Poderia
se dizer que o existencialismo é uma corrente de pensamento que concebe a
especulação filosófica como análise do cotidiano da experiência humana em todos
os seus aspectos teóricos e práticos, individuais e sociais, instintivos e
intencionais, mas sobretudo os aspectos irracionais da existência humana.
Mas
o existencialismo é mais que uma doutrina, é um movimento que centra sua
reflexão no sujeito concreto e singular em oposição ao sujeito abstrato e
universal recorrente na filosofia tradicional. É pelo homem em sua singularidade
que o existencialismo se interessa.
Porém
antes de continuarmos a tentar definir o existencialismo, cabe perguntar o que
é existir? Existir implica a relação do homem consigo, com os outros e com as
coisas. Existir é relacionar-se e essas relações são múltiplas, concretas e
dinâmicas, determinadas e indeterminadas. Existência é, portanto um poder-ser,
que, por conseguinte é uma incerteza, um risco, uma escolha, um lançar-se ao
desconhecido.
O
existencialismo busca discernir a não identificação entre a racionalidade e a
realidade, tendo como ponto de partida o homem e utilizando como método a
fenomenologia.
Parte II - Os Precursores do
Movimento
“A vida é o pânico num teatro sem
chamas”
SARTRE
As filosofias da existência, outra
designação para o existencialismo, surgiram propriamente no século XX, mas
sofreram grande influência de alguns filósofos anteriores, conhecidos por essa
contribuição como pré-existencialistas.
Nas raízes mais remotas do
existencialismo encontra-se o pensamento de Schopenhauer, Kierkegaard e em suas
raízes mais próximas o pensamento de Husserl.
Os filósofos pré-existencialistas
mais remotos contestaram ao hegelianismo
de modo radical, tendo como seu principal expoente o filósofo alemão
Schopenhauer.
SCHOPENHAUER
Arthur
Schopenhauer (1788-1860) dizia que Hegel era um verdadeiro charlatão ao
construir sua filosofia segundo os interesses do Estado prussiano, chegando a
considerá-lo como um mercenário acadêmico.
Na
sua principal obra O Mundo como Vontade e
Representação, Schopenhauer sustenta que, como o conhecimento é uma relação
na qual o objeto é percebido pelo sujeito, o homem não conhece as coisas como
são, apenas como elas podem ser percebidas e interpretadas, se opondo ao
conhecimento absoluto preconizado por Hegel. O mundo nada seria senão
representação e essa representação seria uma ilusão, pois o objeto conhecido é
condicionado pelo sujeito. Entretanto através do insight intuitivo, algo parecido como uma iluminação, o homem
poderia chegar a essência das coisas, e esse processo só seria possível pela
arte, onde o sujeito ao desprender-se de sua individualidade fundir-se-ia no
objeto, numa entrega pura e plena.
Sua
filosofia, contudo, é marcada por uma visão pessimista do homem e de sua
existência. Para ele, o homem é essencialmente vontade, o que o levaria a
desejar sempre mais, sendo marcado ora pela ansiedade, ora pelo tédio, refém de
uma insatisfação constante. A essência do homem e do mundo é essa vontade
insaciável que originaria, segundo ele, as lutas, as dores e os sofrimentos
entre os homens.
A
história é uma história de lutas, onde a infelicidade é a regra e a felicidade
é a exceção. Para ele a concepção racionalista da história, elaborada por
Hegel, que possui um sentido e progride em direção a uma maior liberdade era
apenas uma interpretação sem fundamento e sem conexão com a realidade.
KIERKEGAARD
Sören
Kierkegaard (1813-1855) também se insurgiu contra a supremacia da razão, tal
como Hegel a propunha, pois ela não levava em consideração a subjetividade
humana. Kierkegaard afirmava que a existência humana possuía três dimensões:
·
A
dimensão estética – na qual o homem busca apenas o prazer;
·
A
dimensão ética – na qual se instaura a contradição entre o dever e o prazer;
·
A
dimensão meta-ética ou religiosa – a mais elevada onde o homem supera as
contradições através do salto da fé.
Kierkegaard
também concebia a existência como relação e procurou analisar problemas
oriundos dessas relações consigo, com o mundo e com Deus:
·
A
relação do homem com o mundo é marcada pela angústia. A angústia é entendida
como o sentimento profundo de perceber a instabilidade de viver num mundo
aberto as possibilidades, sem garantia nenhuma de que nossas expectativas irão
ser realizadas;
·
A
relação do homem consigo mesmo é marcada pela inquietação e pelo desespero.
Isso ocorreria por duas razões principais – ou porque o homem não está
satisfeito com as possibilidades que realizou ou porque não conseguiu realizar essas
mesmas possibilidades;
·
A
relação do homem com Deus é marcada pelo paradoxo de se ter de abandonar a
razão para poder compreender pela fé.
HUSSERL
Edmund
Husserl (1859-1938) formulou um método de investigação filosófica conhecido
como fenomenologia.
Com
o termo fenomenologia não quer referir-se nem ao estudo do fenômeno entendido
como síntese a priori, da qual fala Kant, nem ao itinerário da consciência
natural para o saber absoluto, do qual fala Hegel. A fenomenologia quer estudar
o objeto como se manifesta em sua realidade rigorosa, absolutamente pura, livre
de qualquer preconceito.
O
método fenomenológico consiste de duas fases, uma negativa outra positiva. A
fase negativa, chamada de redução fenomenológica, é aquela que parte do
pressuposto de que para se conhecer o objeto é preciso aproximar-se dele com a
consciência pura, livre de pensar dele qualquer coisa que possa ter sido dito
pela história, ciência, filosofia, literatura, religião e até mesmos pela
consciência natural (isto é, pelo bom senso). A redução fenomenológica nada tem
a ver com a dúvida cartesiana, esta se aproxima do objeto colocando tudo o que
já foi dito dele em suspeição, ao contrário, a redução fenomenologia se
aproxima do objeto colocando, não em suspeição, mas em suspensão o que já foi dito
acerca dele.
A
fase positiva é aquela em que o olhar da inteligência se dirige à própria
coisa, penetra-a e faz com que se manifeste em toda a sua realidade.
Husserl
elabora o conceito de intencionalidade, afirmando que esta é a principal
característica da consciência – toda
consciência é consciência de alguma coisa – insurgindo a psicologia
clássica que reduz a consciência a mera passividade, sem liberdade e desprovida
da atividade de dar sentido às coisas.
Parte III – Os Continuadores do
Movimento
“O que é terrível não é sofrer nem
morrer, mas morrer em vão”
SARTRE
HEIDEGGER
O
maior representante do movimento existencialista é Martin Heidegger
(1889-1976). Procurou reconstruir a metafísica em novas bases, mediante a
aplicação do método fenomenológico ao estudo do ser.
Rompendo
com a tendência dominante da filosofia moderna que, desde Descartes estava
voltada para a teoria do conhecimento, Heidegger retomou a questão da
ontologia, a investigação do ser, pois para ele o problema central da filosofia
é o ser, a existência de tudo. Contudo o ser nunca se manifesta diretamente,
imediatamente, em si mesmo, mas sempre como o ser deste ou aquele ente.
Por
isso, para chegarmos a determinar a natureza do ser, devemos partir do estudo
do ser de algum ente particular. Ente é tudo aquilo de que falamos, tudo aquilo
a que, de um ou de outro modo, nós nos referimos; é também o que nós somos e
como o somos. Agora de qual ente devemos extrair o conhecimento do ser? Segundo
Heidegger o ente que detém a primazia é o homem, pois não é ente qualquer
porque tem relação singular com o ser.
Na sua
pesquisa antropológica, Heidegger descobriu no homem alguns traços fundamentais
de seu ser, traços aos quais dá a designação de existenciais.
·
O
primeiro existencial é o ser-no-mundo
– o homem é lançado ao mundo, sem saber por quê. Ao despertar para a
consciência da vida, já está aí, sem ter pedido para nascer e sem saber como
viver. O sujeito aqui se exprime com o cuidado com as coisas.
·
O
segundo existencial é o ser-com-os-outros
– se não há sujeito sem mundo (ser-no-mundo), também não há sujeito isolado dos
outros. O sujeito aqui se exprime por cuidar dos outros de duas formas: na
primeira, procura subtrair os outros de seus cuidados; na segunda, procura-se
ajudá-los a conquistar a liberdade de assumir seus próprios cuidados. No
primeiro caso, temos um simples estar junto, já no segundo temos um coexistir.
·
O
terceiro existencial é o ser-para-a-morte
– é aqui que os homens se separam, uns tendendo para uma existência inautêntica
e outros para uma existência autêntica. Leva vida autêntica quem tem coragem
diante da angústia, que torna-se si mesmo e não o que os outros são, não se
deixa absorver com-o-outro e para-o-outro, e é só a morte que pode
tornar o homem completo.
SARTRE
Jean-Paul
Sartre (1905-1980) chegou a conclusões diferentes e até mesmo opostas a
Heidegger no que se refere ao ser. Para Heidegger, o ser é o valor e a
positividade de todo ente e o homem por sua vez é a porta de acesso ao ser.
Para
Sartre, o ser, que chama de ser-em-si, para distingui-lo da consciência, que
chama de ser-para-si, é massa inerte, informe, inchada. Falando do ser, Sartre
muitas vezes diz que é alguma coisa em demasia e isso por dois motivos: o
primeiro é que a consciência jamais consegue esgotar toda a sua realidade; a
segunda é que o ser-em-si dá a impressão de ter mais do que o necessário.
Outra
característica do ser é a contingência. O ser não tem nenhuma necessidade.
Existir é simplesmente ser; os existentes aparecem, deixam-se encontrar, mas
não se deixam deduzir.
Mas
a característica do ser que Sartre mais insiste é o absurdo, no absurdo está a
chave da existência de cada coisa. Tudo o que existe é destituído de
explicação.
Para
Sartre o desejo é a deficiência do ser, pois o homem sempre está em busca de se
completar, está sempre em falta, nunca é, sempre está a projetar-se.
Para
Sartre o que mais distingue o homem dos outros seres é a liberdade. Como
constitutivo último, a liberdade não tem limites, estamos condenados a ser
livres, isto significa que não se pode encontrar para a liberdade nenhum limite
que não seja ela mesma; ou, se preferir, que não temos a liberdade de deixarmos
de sermos livres. A liberdade também não está vinculada a nenhuma lei moral, a
sua única norma é ela mesma.
O
homem é profundamente desejo de ser Deus. Deus não é senão este desejo mal
sucedido. O em si do mundo e o para si da consciência se encontram em estado de
perpétua ruptura com relação à síntese ideal que jamais existiu, mas que é
sempre indicada, embora sempre impossível. Para Sartre a característica
tipicamente humana é o nada: um espaço aberto, isso não significa e a
totalidade do homem que, por exemplo, inclui seu corpo, seja nada. Esse nada é
nossa característica típica, singular, aquilo que faz do homem um ente não
estático, não compacto, acessível as possibilidades de mudança e é no exercício
da liberdade, em situações concretas, que move o homem, que gera a incerteza,
que leva a produção de sentidos, que impulsiona a ultrapassagem de limites.
MARCEL
Gabriel
Marcel (1887-1973) tentou criar uma metafísica existencialista. Para ele a
metafísica não era uma curiosidade transcendente, antes era apetite do ser.
Marcel adverte contra o erro bastante difundido ao se considerar a pesquisa
metafísica uma especulação vazia; para ele metafísica é a pesquisa do que é, do
ser. Esta pesquisa não pode ser posta de lado, porque o homem tem fome do ser.
Marcel
também tentou estabelecer alguns traços diferenciativos entre a pesquisa cientifica
e a pesquisa filosofica. Segundo ele, uma das diferenças mais marcantes é a de
que a pesquisa cientifica pode ser feita por um só em nome de todos, ao passo
que a segunda deve ser feita por cada um.
Marcel
também ilustra a diferença entre filosofia e ciência em termos de problema e mistério.
“Parece de fato que entre problema e mistério existe diferença essencial:
problema é algo que encontro todo inteiro de mim e que posso analisar e
reduzir; mistério é algo em que eu mesmo estou empenhado e que, por isso, só
pode ser pensado como esfera na qual a distinção do em mim e do diante de mim
perde seu significado e o seu valor inicial. Enquanto um problema autêntico se
justifica segundo certa técnica apropriada, em função da qual se define, um
mistério transcende por definição toda técnica imaginável”.
Outra
distinção apontada por Marcel implica em dizer que a reflexão cientifica é
fragmentária e separatista, enquanto a reflexão filosófica é gregária e
unificadora.
Para
Marcel o homem é fundamentalmente ser encarnado, e por encarnado quer dizer
aparecer em um corpo, sem poder identificar-se com ele e sem poder
distinguir-se dele. Individualidade para me distinguir dos outros seres e
participação para me relacionar com os outros seres, eis que a encarnação faz.
Ainda,
segundo Marcel, o homem é também ser itinerante, isto é, um ser peregrino e não
errante, pois movido de esperança.
A
essa transcendência não se chega por meio de argumentações ou processos
lógicos, mas pela intuição. O homem então não está preso a camisa de força do
desespero, nem voltado para a morte, como queriam Heidegger e Sartre.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
PENHA,
JOÃO DA. O que é Existencialismo. São
Paulo: Editora Brasiliense, 2004.
MARÍAS,
JULÍAN. História da Filosofia. São
Paulo: Martins Fontes, 2004.
GEISLER,
NORMAN. Enciclopédia Apologética. São
Paulo: Editora Vida, 2001.
COTRIM,
GILBERTO. Fundamentos da Filosofia.
São Paulo: Saraiva, 2006.
REALE,
GIOVANNI; ANTISERI, DARIO. História da
Filosofia: De Nietzsche à Escola de Frankfurt. São Paulo: Paulus, 2005.
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